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Registo de autoridade
Irmandade dos Clérigos Pobres
ICP · Pessoa coletiva · 1843 - 1877

A Irmandade dos Clérigos Pobres existia já em 1415, com o título de Caridade e Protecção da Santíssima Trindade, conforme constava do seu Estatuto ou Compromisso feito em 1452. Do Prólogo do Compromisso de 1617 constaria a seguinte anotação relativamente à instituição desta Irmandade: “Querendo uns antigos e devotos sacerdotes, unidos com vínculo de paz e amor, exercitar-se em obras de caridade, ajudando-se uns aos outros nas necessidades espirituais e corporais, instituíram uma Irmandade com o título da Caridade, debaixo da protecção da Santíssima Trindade”. Se a principal missão da Irmandade era a ajuda aos irmãos necessitados, aparecem igualmente como obrigações dos irmãos, expressas nos vários Compromissos com algumas variantes: assistir aos enterros e missas por alma dos irmãos falecidos, assistirem e participarem nas comemorações e festividades anuais em honra da Santíssima Trindade, no dia de Defuntos e no Natal, visitar e prestar assistência aos Irmãos pobres e doentes e comparecer à Mesa quando convocados e cumprir com o que a Mesa determinar. Foram aprovados e confirmados diversos compromissos: o referido de 1452 e as reformas do mesmo, efectuadas em 1572 e 1617. Sabe-se que em 1617 a Irmandade estava sediada na Igreja de Santa Justa, em Lisboa, de onde saiu para o Hospital de Todos-os-Santos, mudança justificada pelo facto de, na Igreja de Santa Justa, não possuir uma “casa própria, em que fizesse as suas Juntas, e em que tivesse com resguardo a sua fábrica, realizando as reuniões da Mesa na sacristia da Igreja”, tendo a Irmandade da Misericórdia de Lisboa oferecido uma casa própria na Igreja do Hospital para o exercício das suas funções, em 1646. Não sabemos onde se encontrava a Irmandade sediada por altura do Terramoto de 1755, já que o grande incêndio que havia ocorrido no Hospital de Todos-os-Santos em 1750 tinha desalojado quase toda a população do mesmo, mas conhecemos o seu percurso desde aí, através do texto dos Estatutos de 1845, que dá notícia de que a Irmandade dos Clérigos Pobres funcionou, após o Terramoto, em diferentes casas: na capela de Nossa Senhora da Pureza da casa do Conde de Castelo Melhor, na Igreja de S. Roque, na Basílica de Santa Maria Maior, na capela de S. Luís, Rei de França, no Hospital Real de São José, na paróquia dos Mártires, na do Espírito Santo, na Paróquia de São Tiago e, finalmente, na Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, para onde foi em 1842, com autorização da Irmandade do Santíssimo Sacramento. A Irmandade dos Clérigos Pobres permaneceu na Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, ocupando a casa de despacho da Irmandade de São Miguel e Almas, para a realização das suas reuniões e guarda do seu cartório e outros bens, até 1890. Em 1889, por Decreto de 13 de Julho, a Irmandade recebeu a Igreja, edifício e cerca do extinto Convento de Santa Marta, para ali estabelecer a sua sede e fundar um asilo, hospital e albergue destinado aos irmãos e outros clérigos, mudando-se para este edifício em 12 de Janeiro de 1890. Foi desalojada em 1903, por Decreto de 7 de Maio, vendo-se obrigada a entregar o edifício à administração do Hospital de S. José e mudando a sua sede para a Ermida de Nossa Senhora da Assunção e Santo António do Vale, na Freguesia de Santa Engrácia. Em novo Compromisso aprovado em 1845, refere-se no Prólogo que a Irmandade dos Clérigos Pobres, em 1814, anexara a Irmandade dos Clérigos Ricos, também com o título da Caridade e da Santíssima Trindade, mantendo os Estatutos e a denominação anteriores. Este Compromisso estabelecia, para o governo da Irmandade uma Mesa, composta por um Juiz, quatro Adjuntos, dois Procuradores da Fazenda, dois Secretários, seis Mordomos e um Consultor, este último sem direito a voto e o Definitório, composto de doze irmãos que, juntamente com a Mesa, constituíam a Junta Grande. Depois de uns Estatutos aprovados pela Irmandade em 1871, mas que não chegou a receber sansão régia, reformam-se novamente os Estatutos em 1887, no qual o corpo administrativo continua a ser a Mesa, eleita por dois anos e é composta por um Juiz, dois Adjuntos, dois Secretários, um Tesoureiro, dois Procuradores, um da Mesa outro da Irmandade e três Visitadores dos Pobres. Em lugar da Junta Grande que era constituída anteriormente pelos membros da Mesa e pelos Mordomos, cria-se o órgão da Assembleia-geral da Irmandade, composta por todos os irmãos da Irmandade. Em finais do século XIX foram incorporadas na Irmandade dos Clérigos Pobres mais duas irmandades: a dos Clérigos Pobres de Sintra em 1889 e a dos Clérigos Pobres de Setúbal em 1894. A Irmandade dos Clérigos Pobres congregava, como o seu nome refere, sobretudo clérigos, mas previa-se, pelo menos desde 1732, um certo número de irmãos seculares que podiam ser admitidos na Irmandade. O número de irmãos que podiam ser recebidos foi variando desde a sua instituição: dos 100 passaram a 160 e em 1732 podiam ser admitidos até 200 sacerdotes e 20 seculares. Com os Estatutos de 1845 deixou de ser imposto limite ao número de irmãos que podiam ser admitidos. A Irmandade dos Clérigos Pobres foi convertida em Montepio do Clero Secular Português a 1 de Julho de 1912, por iniciativa e diligências dos Padre Alfredo Elviro dos Santos, último Juiz da Irmandade dos Clérigos Pobres de Lisboa.

ISSNC · Pessoa coletiva

A Irmandade do Santíssimo Sacramento e Nossa Senhora da Caridade da freguesia de São Nicolau da cidade de Lisboa é resultante da junção entre a Congregação de Nossa Senhora da Caridade e a Irmandade do Santíssimo Sacramento. A união ocorre com a assinatura do alvará régio de 30 de março de 1857, justificada pela proximidade existente entre ambas e por na prática já existir. Pôde ler-se no preâmbulo do compromisso que oficializa a ligação entre ambas: “(…) conhecendo pela experiência a necessidade urgente da reforma dos seus Compromissos, não só porque os atuais, que se regem há perto de um século não preenchem os fins, que as necessidades atuais do tempo exigem; mas também, e muito principalmente, porque os mesmos Compromissos não estão legalmente aprovados (…)”, mais adiante, o artigo 1.º do capítulo I - Da Irmandade e seus fins, se acrescenta “A Irmandade do Santíssimo Sacramento, e a Congregação de Nossa Senhora da Caridade da Igreja Paroquial de São Nicolau de Lisboa, as quais até ao presente (ainda que fossem ambas compostas dos mesmos Confrades, e não pudesse pertencer a uma sem também pertencer a outra) eram regidas por Compromissos separados, ficam d’ora em diante sendo uma única Irmandade regida por um único Compromisso. Art. 2.º A Irmandade, e Congregação reunidas, denominar-se-ão d’ora em diante = Irmandade do Santíssimo Sacramento e Nossa Senhora da Caridade da Igreja Paroquial de São Nicolau de Lisboa. O artigo 3.º, nos seus pontos 1 e 2 define a nova irmandade e os seus fins: “Associação de pessoas, que, professando a religião Católica Apostólica Romana, tem por fins: § 1.º Prestar Cultos ao Santíssimo Sacramento da Eucaristia, e à Santíssima Virgem Maria Senhora Nossa, debaixo da Invocação da Caridade. § 2.º Socorrer os Irmãos pobres, e enfermos, ou presos, e os Paroquianos pobres enfermos, pelo modo que no lugar competente se dirá.” Os estatutos de 2012 mantêm a essência: “a) Promover, subsidiar e intensificar o culto ao Santíssimo Sacramento e a Nossa Senhora da caridade; b) Fomentar a vocação cristã dos seus membros e colaborar ativamente em ações de formação cristã na Paróquia; c) Sufragar as almas dos Irmãos e benfeitores falecidos; d) Empreender obras de caridade.
Existe um vazio bibliográfico quer em relação à história da Irmandade do Santíssimo Sacramento, como à Confraria da Nossa Senhora da Caridade antecessoras da atual Irmandade do Santíssimo Sacramento e Nossa Senhora da Caridade da freguesia de São Nicolau da cidade de Lisboa. Não obstante, venturosamente, no que concerne à Congregação da Caridade, o único documento normativo incluso no acervo, o Compromisso aprovado em 9 de setembro de 1750 pelo Patriarca de Lisboa, encerra informação relevante quanto à data de fundação da congregação. Destarte, no seu capítulo XIII – “Em que se declara não ser nova esta pia Congregação da Caridade”, se afirma que o monarca da coroa portuguesa, à época, D. João V, cognominado “o Magnânimo”, enquanto personificação da citada virtude “(…) no ano de mil setecentos vinte e três deu o exemplo para se erigir esta pia Congregação.” (p. 37). Nos documentos anexos ao Compromisso, que surgem no final, em particular na cópia da carta que foi enviada ao Cardeal Patriarca, faz-se referência ao antigo Compromisso, datado de 1727 que seria revogado com a aprovação deste que se submetia agora para validação.

Ainda que não exista na documentação que constitui o acervo ou na bibliografia pesquisada sobre a entidade uma data concreta para a fundação da Irmandade do Santíssimo Sacramento, é pertinente relembrar que as confrarias existem entre nós desde meados do século XV. Em conformidade com informação coligida num artigo subordinado à história da solenidade do Corpus Christi em Portugal, na página do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, o compromisso mais antigo de uma confraria devota ao culto do Santíssimo existente é o da freguesia de Castro (Ponte da barca) datado de 1457.
Dá-mos conta de alguns documentos que integram o fundo e que consideramos relevantes para a apresentação de uma data aproximada: no códice datado de 10 de agosto de 1757, intitulado “Diversas lembranças e curiosidades relativas à Irmandade e seus bens” existe uma relação dos juízes, escrivães, procuradores e tesoureiros que serviram na irmandade entre 1669 e 1760. Esta é a data mais antiga quer surge associada à estrutura orgânica da Irmandade do Santíssimo Sacramento (PT-PSN-ISSNC/A/A/08/008); os contributos coligidos na compilação de diversos documentos existentes no cartório da Igreja Paroquial de São Nicolau de Lisboa sobre a fundação da irmandade realizada pelo prior Francisco do Rosário e Melo, intitulada “Descrição miudamente circunstanciada da antiga Igreja de São Nicolau de Lisboa: abatida e incendiada por ocasião do terramoto no dia memorável do 1.º de Novembro de 1755 e que compreende a relação das alfaias e preciosidades, que a Irmandade dos Santíssimo Sacramento então perdeu: o número de eclesiásticos empregados no serviço da mesma Igreja; a ordem e perfeição que se observava no Culto Divino e outras notabilidades. A que se junta a curiosa memória da reedificação da nova Igreja, e diligencias até agora empregadas para o andamento da obra”, publicada em 1843 (PT-PSN-ISSNC/A/B/03/066); também dos excertos extraídos da obra "Mapa de Portugal antigo e moderno - Dicionário Geográfico, Estatístico, Corográfico, Heráldico, Arqueológico, Histórico, Biográfico e Etimológico de todas as cidades, vilas e freguesias de Portugal e de grande número de aldeias" do padre João Batista de Castro, sobre a freguesia e paróquia de São Nicolau; e ainda, de um trecho extraído do "Códice de Gonzaga Ferreira" com informação acerca da paróquia e templo de São Nicolau (PT-PSN-ISSNC/A/A/04/004).
Foram essas informações que recolhemos, articulamos e sintetizamos: a Igreja paroquial de São Nicolau terá sido mandada de novo erigir em 1280 pelo bispo D. Mateus, (fl. 1, frente, extraído do Mapa de Portugal antigo e moderno, pelo Padre João Batista de Castro. Tomo 3, folhas 227) havendo iniciado as obras de reedificação em 1616, deslocando-se então a administração dos Sacramentos para a Igreja de Nossa Senhora da Vitória, sita na rua da Vitória, freguesia de São Nicolau. O Santíssimo Sacramento é transferido para o edifício da nova igreja em 8 de agosto de 1627, ainda que a conclusão das obras só tenha ocorrido em 1650 (p. 3). A descrição da sumptuosidade da nova igreja, da riqueza do seu conteúdo (alfaias, paramentos, objetos litúrgicos, quadros, ornamentos, imagens, etc.) encontra-se explanada desde a p. 4 até à p. 12, ainda que com outras informações intercaladas. Na p. 7, ponto 9.º, o autor refere que dentro do arco da capela-mor, à parte da Epístola, existia uma porta que dava passagem para a sacristia dos padres; e defronte, no lado do Evangelho, havia uma outra que dava para a sacristia da Irmandade do Santíssimo. Nessa sacristia confessava o capelão da irmandade. A irmandade dispunha de duas sacristias, uma onde se celebrava e onde haviam colocado a imagem de Nossa Senhora da Soledade, sendo ali onde se paramentavam os padres para as missas cantadas. Esta sacristia comunicava-se com a primeira, a qual ficava por detrás da colateral do Santíssimo, nas quais se paramentavam os muitos capelães que a irmandade administrava e os mais padres para as missas rezadas. No ano de 1750 abriu-se nesta sacristia uma porta que dava para a rua a fim de por ela sair o Santíssimo por Viático por ocasião das Endoenças (p. 8., ponto 10).
À época, a irmandade dispunha, para ajudar à missa o capelão da irmandade e a mais de vinte capelães de capelas que administrava, e para sair com o Senhor aos enfermos e servir as missas cantadas, de três meninos da sacristia (p. 12, ponto 16).
Havia nesta igreja para além da Irmandade do Santíssimo, a das Almas, a de Nossa Senhora das Mercês com seus privilégios; a de Santo António, e tinha havido a de Nossa Senhora da Conceição, que se achava extinta, e que ainda conservava alguma fábrica. Contava aí também a Irmandade de Nossa Senhora da Caridade, que socorria os paroquianos pobres enfermos e lhes fazia o funeral quando necessário. Pertenciam-lhe os covais do meio da igreja, comprados pelo prior João Antunes Monteiro com o fundo de várias propriedades. Corroborando o que já se afirmou sobre o fato de as duas irmandades serem anexas, pode também aqui ler-se: “de sorte que a mesa que acabava nesta, se acha servindo naquela, sendo o juiz, provedor, o escrivão, secretário, procurador, e tesoureiro, os mesmos, e doze enfermeiros, que a dois, e dois curavam dos doentes cada mês, o que se fazia com grandeza e exemplaridade, e ainda hoje existe com o fundo de algumas propriedades, que escaparam, e de vários dinheiros a juro, que se conservam.” (p. 14, ponto 19).
Os eventos ocorridos desde o dia do terramoto de 1755 até ao ano de 1802 foram narrados por Pedro Francisco Leal, tesoureiro da irmandade do Santíssimo Sacramento, que diz discorrer «por lembrança e por ouvir dizer» que se celebrava na igreja a missa da festividade de Todos os Santos quando o chão tremeu, resultando na perda de todas as suas alfaias, templo e perto de quatro mil pessoas do seu distrito (fl. 7, frente, extraído do códice de Gonzaga Ferreira, folhas 113 – Biblioteca Nacional de Lisboa). O Santíssimo Sacramento foi levado para Santa Justa e dali para uma barraca, que se armou no Rossio, saindo dali após alguns dias para a ermida do marquês do Castelo Melhor, voltando à sua igreja no dia 6 de agosto de 1769. (p. 15, ponto 21). Juntamente com o procurador da irmandade, Félix José de Barros, fora incumbido pela Mesa a guardar os despojos que tinham sobrevivido ao fogo e aos ladrões (p.16, ponto 22).
As obras de reedificação só viriam a ter lugar cerca de vinte anos depois, em 1768, em conformidade com o disposto nas bulas pontifícias e alvarás régios concedendo parte dos dízimos e do rendimento das capelas administradas pela irmandade para serem aplicados nesse fim (p. 17, ponto 23). Foi o prior Luís Monteiro Henriques quem solicitou ao arquiteto Reinaldo Manuel que lhe fizesse a planta da nova igreja, a qual foi aprovada pelo rei D. José I (p. 18, ponto 25). O desmancho da antiga igreja iniciou a 9 de fevereiro de 1775. Para inspetores da nova igreja foram nomeados Pedro Francisco Leal e António Gonçalves da Cunha Freitas, e para escrivão da mesma inspeção José Anastácio Luís Ventura. Após discussão sobre o lugar onde seria reedificada, ficou sendo no mesmo lugar.
A 16 de setembro de 1775 deu-se início ao novo templo. Encontra-se transcrita a inscrição latina, e sua tradução, que foi colocada na pedra angular do edifício e se discorre com detalhe sobre os preparativos para a cerimónia onde o ato decorreria (1 de setembro de 1776) com a presença de convidados ilustres, entre os quais o próprio Marquês de Pombal. (p. 19, ponto 26). Da p. 28 à 41 acham-se descritas com pormenor as obras de reedificação da Igreja de São Nicolau de Lisboa referente ao período entre 1775 e 1802. Depois dessa data, os factos apresentados são narrados pelo prior Francisco do Rosário e Melo, e dizem respeito ao período entre 24 de junho de 1826, aquando da sua admissão ao serviço da igreja no ministério de capelão cantor, e 22 de agosto de 1827 em que tomou posse do priorado por resignação do prior Pedro Nolasco Alves. Através do seu testemunho temos notícia das contrariedades existentes entre a irmandade e outros religiosos: “Cansados o Reverendo Prior, Colegiada, e a mesma Irmandade de sofrer as continuas implicações do Reverendo Pároco da Freguesia da Conceição, em cujo distrito ficou incluída a Ermida de Nossa Senhora da Victoria pela nova divisão das Freguesias; e não menos com as desinteligências entre os Irmãos da Confraria da mesma Senhora; resolveram dar principio á obra da Barraca para quanto antes se transportarem para a nova Igreja (…)”. (p. 41, ponto 49). As obras estiveram paradas desde 1802 até cerca de 1842. A igreja só ficou concluída no ano de 1850 (fl. 9, verso, extraído do códice de Gonzaga Ferreira, folhas 113 – Biblioteca Nacional de Lisboa).
Outras fontes que consideramos para o mesmo fim: o “Livro 1.º de inventário dos bens que possui a Irmandade do Santíssimo Sacramento da prioral Igreja de São Nicolau desta cidade de Lisboa”, no qual se encontram registados padrões de juros, prédios rústicos e urbanos, foros, capelas e seus instituidores e dívidas ativas e passivas. Destacamos dois assentamentos: por testamento de 26 de outubro de 1576 deixou Estevão Rodrigues, boticário, umas casas por trás da Igreja da Palma, que partem com casas de Francisco Rodrigues, e com casas de el rei, por se lhe dizerem anualmente em dia de todos os santos três missas, as quais estão suspensas por sentença lançada nos autos de conta de que é escrivão João Maurício Botelho (fl. 9, frente); e em 1634 instituiu Jorge Dias duas missas rezadas cada um ano pela esmola de cinquenta réis cada uma como consta dos autos da conta desta capela em casa do escrivão João Maurício Botelho e não consta nos ditos autos certeza alguma do encargo desta capela mais do que as duas missas rezadas que a 50 réis importam. Deixou para cumprimento desta capela umas casas em Valverde defronte da Ermida da Assunção que se sub-rogarão por um padrão de juro real de um por cento do ouro e pau-preto do Brasil que rende anualmente 80.000 réis (fl. 18, verso). (PT-PSN-ISSNC/ISS/A/A/07/003).
No esboço manuscrito, datado de 1926, denominado "Subsídios para a História da Igreja de São Nicolau de Lisboa compilados por José Natividade Gaspar", o qual o autor dedica a Augusto Anselmo, membro da Irmandade do Santíssimo Sacramento, pode o leitor interessado encontrar informação sobre a Igreja de São Nicolau, relativa ao ano de 1565, mas também sobre a freguesia onde se encontra inserida, facultando ainda uma breve análise socioeconómica dos seus habitantes, figuras ilustres, dos ofícios e profissões e das freguesias ao redor. Na p. 9 do estudo fica dito que a freguesia de São Nicolau com os seus muitos paroquianos, muitos deles «de posses e posição sociais de vulto» poderia ser uma «das mais felizes freguesias de Lisboa, e não o era» em virtude das ditas insignes figuras da freguesia, de acordo com o texto, «membros decerto, eles todos da confraria do Santo Sacramento, zelosos da perfeição e da magnificência do culto» se terem deixado tomar pela constante inquietação provocada pela magnificência ostensiva da paróquia de S. Julião, paróquia do Paço da Ribeira, real de «facto e de direito». O faustoso templo tinha o cunho e o patrocínio do rei D. Manuel e impelia os primeiros a fazer mais e melhor a fim de a igualar. O autor apressa-se, logo no início do capítulo I, a anunciar a sua fonte, declarando tratarem-se de «pormenores curiosos» que escaparam ao estudo feito pelo ilustre prior da freguesia de São Nicolau, Rosário e Melo sobre a história da igreja de São Nicolau de Lisboa, os quais encontrara na revista “Arte Musical”, nos números de 129 a 134, num artigo da autoria de Gomes de Brito intitulado “Arqueologia musical” sobre diversos músicos nacionais, em particular ao que se referia ao organista Fernão Gomes, que era em 1565 mestre de capela da Igreja de São Nicolau, «uma das mais importantes de Lisboa». (PT-PSN-ISSNC/A/A/04/005).
Em termos orgânicos, de acordo com o compromisso de 1857, a direção da Irmandade do Santíssimo Sacramento dependia da Mesa da Irmandade. É aí que se reúnem os oficiais e os mordomos para diligentemente dar prossecução aos negócios, serviço do Santíssimo Sacramento e aos processos de admissão de irmãos novos. Dela fazem parte os seguintes membros: juiz, escrivão, procurador, tesoureiro e doze mordomos. Contudo, a sua ação decisória e executiva excluía algumas questões, às quais tinham de ser discutidas com os definidores, os quais, poderiam convocar a Junta Grande.
Embora as atribuições permanecessem quase inalteráveis, a constituição da Mesa sofre alterações no novo compromisso de 1857 que inaugura a fase conjunta da Irmandade do Santíssimo Sacramento e da Confraria da Caridade. Os membros desta congregação eram-no também da do Santíssimo Sacramento, mas regiam-se por estatutos próprios, com data de 1750, que, tal como no caso de Santíssimo, se encontrava desfasado em relação às circunstâncias atuais justificando a sua reforma. A ocasião prestou-se também para reunir formalmente o que já o estava no quotidiano.
Assim, temos agora como corpos gerentes da Irmandade do Santíssimo Sacramento e Nossa Senhora da Caridade da freguesia de S. Nicolau, uma Mesa Administrativa eleita bienalmente em Assembleia Geral, sendo composta pelos seguintes membros: juiz, assistente ao juiz, 1.º e 2.º escrivão, 1.º tesoureiro e 2.º tesoureiro, fiscal, procurador da irmandade e pelo procurador da Mesa; uma Comissão Revisora de Contas, integrada por três irmãos expeditos em escrituração e que “tenham prática dos negócios, usos, e costumes da irmandade” (cap. IX, art.º 56.º); e uma Assembleia Geral, constituída por todos os irmãos congregados. A Mesa da Assembleia era presidida pelo juiz, ou pelo seu assistente, na sua ausência o 1.º ou o 2.º escrivão da Mesa Administrativa exercia a função de secretário. O compromisso de 1934 traria algumas alterações quanto à constituição dos corpos gerentes e suas atribuições, as quais se manteriam até à sua reforma com a aprovação dos estatutos de 1993 onde se registam também modificações ao nível orgânico: as competências da Mesa Administrativa passam para a Direção, órgão constituído por um presidente, um vice-presidente, um secretário, um tesoureiro e três vogais; a Assembleia Geral, que se compõe de um presidente, um secretário e um vogal; e um Conselho Assessor, formado por um presidente, um secretário e um vogal que assegura, as funções que antes impendiam sobre a Comissão Revisora de Contas. Os últimos Estatutos datam de 5 de julho de 2012 e seguem o conteúdo do anterior de 1993.
Abrimos aqui um parêntesis para referir alguns marcos importantes na história da irmandade: o início das obras de reedificação da Igreja de S. Nicolau em 1776, vinte e um anos após a sua destruição pelo terramoto e incêndio que se lhe seguiu; as novas obras do templo que conduziram ao pedido de empréstimo feito pela Irmandade do Santíssimo Sacramento por forma a concluí-las. A Irmandade é autorizada por decreto de 18 de julho de 1845 a contrair um empréstimo de dezasseis contos de réis, com juro de cinco por cento ao ano, pela criação de uma companhia “Auxiliadora”. A documentação existente no acervo relativa à companhia “Auxiliadora” vai de 1845 a 1883, mas não identificamos nenhuma data que fixe a extinção da mesma. Convergindo para o mesmo esforço, a Fábrica da Igreja da paróquia de S. Nicolau de Lisboa, à qual cabe a administração dos bens eclesiásticos e o exercício do culto em S. Nicolau, antes sob a gerência da Junta da Paróquia, passa a ser administrada pela irmandade a fim de, depois de satisfeitas todas as obrigações e encargos, aplicar os rendimentos nas obras de conclusão da citada. A última menção feita nos estatutos sobre a irmandade enquanto corporação fabriqueira surge no de 1934.
Outro evento a realçar é a inauguração, a 19 de junho de 1865, da escola de instrução primária instituída em memória do rei D. Pedro V para os filhos dos irmãos necessitados e famílias pobres da paróquia de São Nicolau, cuja criação se deve, de acordo com a notícia publicada pelo “Diário de Notícias” de 19 de junho de 1915, à proposta de José Miguel Anastácio de Abreu com colaboração do Dr. Silvério A. Barata Salgueiro. As aulas eram ministradas no segundo direito e terceiro andar esquerdo do prédio da rua dos Douradores, n.º 72, até 11 de Outubro de 1914, data em que se inauguraram as novas instalações das escolas para ambos os sexos. O evento teve grande repercussão nos periódicos da capital. O jornal "República", de 12 de outubro de 1914, publica um artigo onde se pode ler na página três: "Pode considerar-se modelar essa instalação na qual a luz entre a plenos jorros e cujo material pedagógico é perfeitíssimo. Na «terrasse» para recreio, no salão de inverno, no refeitório como na aula tudo é claro, alegre e de molde a tornar fácil e atraente às crianças a escola. São também muito confortáveis os gabinetes dos professores possuindo todas as salas esterilizadores para a água." O 50.º aniversário das escolas da irmandade no ano seguinte teve também ampla cobertura da imprensa, culminando o ano de 1915 com a sessão solene de encerramento do ano letivo de 1914-1915 que contou com a presença de altos dignitários, entre os quais o presidente da república Bernardino Machado.
Foi também em 20 de novembro de 1914, que o "Museu de Alfaias Religiosas" instalado na Igreja Paroquial de S. Nicolau foi inaugurado.
O ano de 1918 traria novas obras de melhoramento das instalações das escolas com o projeto de ampliação da marquise da escola do sexo masculino para instalar a cantina escolar, com uma cozinha e refeitório.
Ainda que não tenhamos notícia da data de extinção das escolas a cargo da irmandade, apontamos o ano de 1958, tendo por fundamento a ata da Mesa Administrativa de 28 de agosto de 1958, de acordo com a qual o irmão Dr. Gustavo de Almeida comunica o encerramento das mesmas.
À irmandade cumpria, grosso modo, a gestão dos seus bens patrimoniais e rendimentos; assistência e beneficência em prol dos irmãos e viúvas de irmãos pobres e dos paroquianos pobres; sufragar as almas dos irmãos e benfeitores; prover todas as necessidades da Fábrica da Igreja, cuja administração dos bens e rendimentos passou, por contrato de cedência firmado a 23 de março de 1846, da alçada da Junta da Paróquia para a da Irmandade do Santíssimo Sacramento servindo o propósito de contribuir para as obras de reedificação da Igreja de São Nicolau. A última referência à irmandade enquanto corporação fabriqueira surge nossa Estatutos de 1934. À Fábrica da Igreja pertencia o culto ao Santíssimo e a Nossa senhora da Caridade e assegurar residência ao prior da freguesia. Atualmente, acresce ainda a estes fins o de “fomentar a vocação cristã dos seus membros e colaborar ativamente em ações de formação cristã na Paróquia”.

ISSIE · Pessoa coletiva · 1605 - 2000

Desconhece-se a data em que a Irmandade do Santíssimo Sacramento da Igreja da Encarnação surgiu. Pensa-se que já tivesse sido canónica e legalmente erecta na época em que a Paróquia do Loreto, que estava na altura sediada na Ermida de Nossa Senhora do Alecrim, foi transferida para a nova Igreja, a 8 de Setembro de 1708, sob a invocação de Nossa Senhora da Encarnação.
Em 24 de Janeiro de 1712 já está em actividade na Paróquia, obrigando-se a Mesa da Irmandade do Santíssimo Sacramento, por escritura celebrada com D. Elvira Maria de Vilhena, Condessa de Pontével, viúva do Conde Dom Nuno da Cunha e Ataíde, que fundara e mandara edificar a nova Igreja com a invocação de Nossa Senhora da Encarnação, a cumprir as condições e cláusulas da escritura celebrada em 1698 entre a Condessa e o Cabido da Sé de Lisboa.
A Irmandade do Santíssimo Sacramento da Igreja de Nossa Senhora da Encarnação estabelece no seu Compromisso de 1817, o primeiro aprovado após o Terramoto de 1755 que destruiu o Cartório da Irmandade, que o objectivo principal desta Irmandade é “o Culto e Serviço do Santíssimo Sacramento”, sendo obrigação de todos os irmãos participarem nas festividades e procissões na Igreja da Encarnação, assistirem no Lausperene, acompanharem o Sagrado Viático no dia da Comunhão Pascal dos entrevados e todas as vezes que o Santíssimo sair da Igreja para a Comunhão aos enfermos.
No Compromisso 1861 estabelece-se como fins da Irmandade: prestar culto ao Santíssimo Sacramento da Eucaristia e a Nossa Senhora da Encarnação e socorrer os Irmãos e os paroquianos pobres enfermos. Os Compromissos de 1886 e de 1893 acrescentam outras incumbências: realizar o enterro dos irmãos quando solicitado, orar pelas necessidades espirituais e temporais dos irmãos vivos e sufragar as almas dos falecidos com orações e esmolas e ainda auxiliar o ensino primário da freguesia.
Já nos Estatutos de 1935 os fins da Irmandade do Santíssimo Sacramento são os seguintes: promover e subsidiar o culto do Santíssimo Sacramento e a devoção das almas do Purgatório e procurar dar maior esplendor às acções litúrgicas na sua Igreja; receber todos os anos o Sagrado Lausperene e fazer a festa anual do Corpo de Deus (orago da Irmandade); orar pelas necessidades espirituais e temporais dos irmãos vivos e sufragar as almas dos falecidos; praticar quaisquer actos de assistência e beneficência em socorro dos irmãos e pobres necessitados e concorrer para o funeral dos irmãos pobres quando requisitado.
Segundo o Compromisso de 1817 não havia limite numérico para a admissão de irmãos na Irmandade do Santíssimo Sacramento da Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, podendo ser irmãos da irmandade todos as pessoas que o quisessem ser, desde que não tivessem sido acusados judicialmente por nenhum crime ou tivessem movido processo judicial contra a Irmandade.
Eram considerados como irmãos as esposas dos irmãos casados e os seus filhos, enquanto estivessem dependentes dos pais, podendo usar capa da Irmandade em todas as funções na Igreja e acompanhar o Santíssimo para a Comunhão aos entrevados.
Com o Compromisso de 1893 podiam ser irmãos da Irmandade do Santíssimo Sacramento todos os indivíduos de ambos os sexos, tendo de ter os seguintes requisitos: serem Católicos, Apostólicos, Romanos; gozarem de boa reputação moral e civil, serem maiores de 21 anos ou emancipados e possuírem os meios económicos suficientes para cumprirem os encargos estabelecidos no Compromisso.
Conforme o Compromisso de 1817, a Irmandade do Santíssimo Sacramento era gerida por uma Mesa, composta pelo Juiz, escrivão, tesoureiro, procurador-geral e procurador da Mesa. Os Irmãos novos, desde que maiores de 21 anos e depois de pagarem a jóia a que eram obrigados, serviam a Mesa como Mordomos durante um ano, a contar da data da sua admissão. À Mesa competia-lhe a gestão de todos os negócios da Irmandade, cuidando especialmente da administração dos seus bens e da devida aplicação dos rendimentos legados pelos doadores.
As reuniões da Mesa deveriam decorrer nos terceiros domingos de cada mês, para tratar do expediente corrente da Irmandade – as Mesas Ordinárias.
Podiam ocorrer ainda reuniões de Mesa extraordinárias, ou Mesa de Definição, para os assuntos mais importantes da Irmandade: eleição de novos mesários, deliberações referentes ao conteúdo do Compromisso que possam acrescentá-lo ou alterá-lo, sobre a aplicação dos artigos do Compromisso em casos concretos, compra ou vendas de propriedades, distrate de juros, distribuição anual das rendas às despesas e tomada de dinheiro a juro ou o seu distrate. Para estas Mesas de Definição, além dos mesários, estariam presentes doze vogais ou definidores, eleitos na mesma altura que os membros da Mesa, tendo sido três deles, obrigatoriamente, mesários ou definidores no ano antecedente.
No Compromisso de 1861, a administração da Irmandade continuava a ser cometida a uma Mesa composta a partir de então pelo juiz, assistente do juiz, primeiro e segundo escrivão, procurador-geral e procurador da Mesa e tesoureiro, eleita de dois em dois anos. Os membros da Mesa tinham de ser maiores de 25 anos, não podiam ser empregados da Irmandade ou da Igreja e não podiam ser devedores à Irmandade ou terem-lhe movido algum processo judicial.
À Mesa competia, além da administração geral da Irmandade, determinar e dirigir as festividades e providenciar para que os rendimentos deixados pelos benfeitores tivessem as aplicações por eles destinadas.
Além da Mesa haveria também um Conselho de Definição composto de doze membros, com funções consultivas, eleitos, como os membros da Mesa, em Assembleia-geral de toda a Irmandade.
A Assembleia-geral da Irmandade deveria reunir-se no quarto Domingo da Quaresma para promover a eleição da nova Mesa e do Conselho de Definição, todas as vezes que o Juiz ou a Mesa achasse conveniente ou por requerimento da iniciativa de, pelo menos, vinte irmãos.
Segundo o texto do Compromisso de 1893, Assembleia-geral era a reunião de todos os irmãos (apenas os do sexo masculino), de maior idade, no gozo dos seus direitos, não podendo estar a dever mais do que dois anuais. As decisões da Assembleia-geral teriam de ser aprovadas por maioria dos irmãos presentes.
As suas atribuições eram as que no Compromisso de 1817 cabiam à Mesa de Definição, acrescentadas das seguintes: aceitar legados, desde que estes não onerassem a Irmandade; resolver sobre troca ou venda de objectos móveis inventariáveis; decidir sobre a instauração de processos judiciais e fixar, sobre proposta da Mesa, os vencimentos dos capelães e dos outros empregados da Irmandade.
As reuniões ordinárias da Assembleia-geral eram realizadas no último Domingo do mês de Maio de cada ano, destinadas à eleição da Mesa e Conselho de Definição, em que se procedia também à apresentação do Relatório das actividades e do estado financeiro da Irmandade relativamente à gerência do ano económico cessante. Podia-se ainda reunir extraordinariamente por determinação da Mesa ou por requerimento de um conjunto de pelo menos dez irmãos, no gozo dos seus direitos.
Além de ser fabriqueira da Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, a Irmandade tinha como especial função o cuidar do Culto Divino da Paróquia de Nossa Senhora da Encarnação.
As principais obrigações dos irmãos da Irmandade eram sobretudo cultuais: comparecer nas festividades e procissões na Igreja, assistirem no Lausperene, acompanharem o Santíssimo Sacramento no dia da Comunhão Pascal dos Entrevados e especialmente na saída para comunhão por Viático aos enfermos, que constituía a razão principal da instituição das irmandades com esta invocação, e acompanhar o enterro dos irmãos falecidos.
A celebração deste acto apresenta-se descrita no Compromisso de 1817: quando fossem chamados com sinal dos sinos ou campainha tocada pelo Andador, deveriam acorrer os irmãos que estivessem perto e não podendo vir, podiam mandar filhos ou outros parentes em seu lugar, devendo velar para que a modéstia e silêncio dominasse durante todo o acto; quando o Sagrado Viático saísse ou entrasse na Igreja, deveriam estar todas as velas e tochas da Capela do Santíssimo Sacramento acesas, algumas velas nos outros altares da Igreja e ainda, se for de noite, duas velas junto à porta. Aos irmãos que moravam longe da Igreja e que, por esse motivo não podiam vir, recomendava-se que deveriam contribuir com esmolas especiais para as Alfaias e despesa da cera que se costumavam gastar naquelas ocasiões.
Os irmãos e filhos de irmãos eram preferidos, quando estivessem em iguais circunstâncias, para os empregos que a Irmandade provia. Tinham o direito a acompanhamento de procissão no seu funeral e nos funerais da sua esposa, filhos e filhas dependentes, sendo o seu corpo conduzido no esquife próprio da Irmandade do Santíssimo Sacramento ou no de outra irmandade ou na tumba da Misericórdia e se viesse o corpo em carruagem até à Igreja, seria recebido pela Irmandade, iniciando-se ali a procissão.
Previa-se já no Compromisso de 1861, a existência de uma ""Caixa de socorros"", na qual entrariam todas as quantias provenientes de metade das jóias pagas pelos novos irmãos e das jóias pagas no acto de posse pelos membros da Mesa eleitos e de todas as esmolas recebidas para este fim. A caixa de socorros era guardada no cofre da Irmandade, havendo dois mealheiros na Igreja para a recepção das esmolas destinadas aos irmãos pobres.
Em dois períodos distintos da história da Irmandade foram nomeadas Comissões Administrativas para o governo e administração da associação.
Por Alvarás do Governo Civil de Lisboa, datados de 21 de Outubro e 15 de Dezembro de 1858, foi nomeada uma Comissão Administrativa, a qual tinha como missão principal a elaboração de um novo Compromisso para a Irmandade do Santíssimo Sacramento da Igreja da Encarnação. Esta Comissão funcionou até 1862, elaborando um novo Compromisso, aprovado pelos irmãos da Irmandade do Santíssimo Sacramento da Igreja de Nossa Senhora da Encarnação em 14 de Setembro de 1861 e aprovado e confirmado por Carta Régia de 26 de Novembro do mesmo ano, com algumas alterações. A Comissão organizou então a eleição de uma nova Mesa da Irmandade, que iniciaria funções a partir daquela data, quando acabassem os trabalhos da Comissão, o que veio a suceder na sessão de 10 de Julho de 1862, estando presente também a Mesa entretanto eleita.
Em 9 de Março de 1911 foi nomeada pelo Governo Civil de Lisboa uma Comissão Administrativa da Irmandade do Santíssimo Sacramento. Os trabalhos da Comissão Administrativa decorreram entre 17 de Março de 1911 e 7 de Fevereiro de 1912. A Comissão Administrativa promoveu a eleição de uma Comissão, de entre os irmãos presentes na Assembleia-geral convocada para 22 de Dezembro de 1911, para proceder à revisão dos Estatutos, entregando a administração da Irmandade à Mesa eleita pela Assembleia-geral da Irmandade em 29 de Dezembro de 1911.

ISMA · Pessoa coletiva · 1756 - 1892

Não se conhece ao certo a data em que foi instituída a Irmandade do Arcanjo São Miguel e Almas na Paróquia de Nossa Senhora da Encarnação. Sabe-se que já existia antes do Terramoto de 1755, possuindo altar próprio, pela informação que é dada no livro das "Memórias Úteis" da Irmandade do Santíssimo Sacramento (f.132 v.º), onde se afirma que a Irmandade estava na Igreja com autorização da do Santíssimo Sacramento.
Sabemos que a Irmandade, a seguir ao Terramoto, deixa de funcionar e só em 1826, já terminadas as obras de reedificação da Igreja, é restaurada por iniciativa de "algumas pessoas levadas por sua caridade, devoção, e pelo Amor de Deus", muitas delas pertencentes à Irmandade do Santíssimo Sacramento da mesma paróquia. Conseguindo congregar número suficiente de irmãos para poder formar de novo a Irmandade, procedeu-se à eleição e nomeação dos membros da Mesa da Irmandade em 8 de Março de 1826.
O primeiro Compromisso da Irmandade de São Miguel e Almas, posterior ao Terramoto de 1755, data já de 1830, tendo sido feito e aprovado em Junta Grande em 5 de Setembro e confirmado pelo Rei D. Miguel em 18 de Fevereiro de 1832. A Mesa da Irmandade de S. Miguel e Almas era composta por um Juiz, dois Assistentes, dois Secretários, um Tesoureiro, dois Procuradores, um da Mesa outro da Irmandade, um Enfermeiro, um Conselheiro e doze Mordomos. A Irmandade de S. Miguel e Almas tinha como finalidades principais prestar culto ao Santo, mantendo o seu altar e alfaias em boa ordem, organizando anualmente e participando na sua festa no dia de S. Miguel, no fim da qual se procedia à eleição de nova Mesa, mandar dizer doze missas no Altar de São Miguel no dia dos defuntos e assistir os irmãos pobres doentes com esmola e enfermeiro. Mas a existência da Irmandade de São Miguel e Almas não foi muito longa. Não detinha quase património próprio nem rendimentos de legados, mas apenas alguns juros de inscrições. As receitas da Irmandade provinham sobretudo das jóias que se cobravam aos novos irmãos e aos membros da Mesa, das quotas pagas anualmente por todos os irmãos e as receitas dos peditórios recolhidas pelo andador. As despesas resumiam-se ao ordenado do andador, às esmolas de missas pagas ao Capelão, às decorrentes das festas anuais no dia de S. Miguel, cera para a vela do altar e outras pequenas quantias para despesa de expediente, mas as dificuldades económicas foram agravando-se tanto que, em 1882, já não possuíam capelão próprio e, em 1884, as receitas provenientes dos peditórios eram já inferiores à despesa com o ordenado do andador. A falta de novos irmãos, o atraso no pagamento de quotas pelos irmãos existentes e pelo facto de, desde 1867, por Ordem do Administrador do Bairro Alto (Circular n.º 83 da 1.ª Repartição do Governo Civil de 1 de Agosto de 1867), os andadores das irmandades das almas da freguesia da Encarnação estarem proibidos de pedir esmola pelas ruas, podendo apenas fazê-lo dentro do templo, provocou a crise financeira que culminou com a redução de trinta por cento nos juros das inscrições decretada pelo Governo, o que acabou por levar à incorporação da Irmandade de São Miguel e Almas na Irmandade do Santíssimo Sacramento, aprovada em Sessão da Mesa em 14 de Março de 1892 e efectivada por Alvará de Governo Civil de 6 de Outubro de 1892.

Irmandade de Nossa Senhora da Oliveira
INSO · Pessoa coletiva

A Irmandade de Nossa Senhora da Oliveira (Ofício dos Confeiteiros) é uma associação de fiéis, estabelecida na ermida do mesmo orago, sita na Rua de São Julião da freguesia do mesmo nome.
Quanto à sua origem, não foi encontrado qualquer registo que permita determinar uma data precisa. A análise à documentação do acervo permitiu constatar que o registo mais antigo sobre a irmandade data de 1624. Presume-se, contudo, que a sua existência remonte a um período anterior.
Por outro lado, não menos imprecisa é a origem da primitiva Ermida da Oliveira, ou Oliveirinha, como também é designada, localizada na antiga Rua Nova dos Ferros, no adro da Igreja de São Julião.
Um apontamento deixado num livro de escrituras da irmandade dá conta de que, aquando da reconstrução da ermida, no século XVIII, foram encontradas as sepulturas dos seus fundadores, Pêro Esteves e sua esposa, Clara Geraldes, ambos oriundos de Guimarães, nas quais consta a informação de que foram ali enterrados no ano de 1300, trazendo de Guimarães a devoção a Nossa Senhora da Oliveira a Santo Elói e a São Gonçalo, patrono dos confeiteiros.
Outras fontes referem a possibilidade de ter ocorrido um erro na interpretação da inscrição encontrada nas sepulturas, colocando a hipótese de Pêro Esteves ser o mercador natural de Guimarães mas residente em Lisboa que protagonizou o milagre do cruzeiro, ocorrido em frente à Igreja de Santa Maria da Oliveira de Guimarães, no ano de 1342 (1), remetendo, por conseguinte, para o século XIV a data da fundação da ermida.
Um índice das escrituras da Irmandade de Nossa Senhora da Oliveira produzidas entre 1727 e 1751, que inclui um apontamento histórico acerca da ermida, menciona, ainda, embora sem precisar uma data, que o templo passou para o domínio dos “Lava-Peixes da Ribeira”, os quais, não podendo reedificar a ermida, que se havia arruinado, renunciaram a todo o domínio.
Posteriormente, em 1646, o prior e beneficiados de São Julião venderam o chão da ermida à Irmandade de Nossa Senhora da Oliveira para que a reconstruíssem, com direito a apresentarem, ali, o capelo.
Por seu lado, sem indicar a que fonte reporta, a publicação “Olisipo: boletim do Grupo "Amigos de Lisboa", n.º83”, menciona o ano de 1563 como a data de trepasse da ermida para a “Confraria dos Confeiteiros”. Não foi encontrada, porém, nenhuma fonte que corrobore esta última hipótese.
Em 1755, à semelhança dos edifícios contíguos, a ermida sofreu os efeitos devastadores do terramoto, tendo sido totalmente destruída pelo incêndio que se seguiu. O evento não poupara os registos da irmandade anteriores a esta data, como atestam os vestígios observados nos documentos que persistem no atual acervo.
Após o terramoto, iniciaram-se, em 1768, os esforços para reerguer a ermida, conforme testemunha um requerimento enviado pela Mesa da irmandade ao ministro do Bairro e ao regedor, para que lhe fosse dado o chão para se fazer a ermida.
No mesmo ano de 1768, a irmandade associa-se à corporação dos confeiteiros, com a criação da Bandeira de Nossa Senhora da Oliveira para representação na Casa dos Vinte e Quatro de Lisboa. A bandeira surge com o ofício dos confeiteiros à cabeça, sendo os carpinteiros de carruagens e picheleiros ofícios coadjuvantes. O termo desta representação ocorre com a extinção da Casa dos Vinte e quatro por Decreto de 7 de maio de 1834.
Muito em virtude das perdas sofridas pela irmandade aquando do terramoto, nomeadamente no que diz respeito à sua atividade anterior a 1755, resultam escassos registos. Ainda que incompleta, a primeira referência explícita aos seus fins e composição surge apenas no século XIX, em dois capítulos em pública-forma com data de 1803.
No século XX, através dos Compromissos/Estatutos de 1911, 1914 e 1934, torna-se possível discernir com exatidão quais os seus fins, composição e atribuições. De acordo com o art.º 1 do Compromisso de 1911, a Irmandade de Nossa Senhora da Oliveira é a “reunião de todos os indivíduos de ambos os sexos, de maior idade ou emancipados, pertencentes às classes de confeiteiros e refinadores d’açúcar que atualmente fazem parte da referida irmandade, e de todos aqueles que de futuro na mesma se quiserem incorporar”.
O art.º 2 determina que o “fim principal da irmandade é prestar culto ao seu orago, Nossa Senhora da Oliveira, e às que se acham em ambos os altares; assistir e beneficiar os irmãos e viúvas destes quando habilitados como pobres e ainda outros, quando as forças do cofre assim o permitam”.
O art.º 3 prossegue enumerando outros fins: “1) Fazer anualmente a festividade a Nossa Senhora da Oliveira (seu orago). 2) Sufragar as almas dos irmãos falecidos. 3) Receber o sagrado Lausperene quando pela Autoridade competente lhe for distribuído. 4) Exercer a beneficência, empregando n’este fim a parte do seu rendimento reservado segundo a lei”.
O documento clarifica a sua estrutura orgânica, composta por uma Mesa de cariz administrativo e uma Assembleia Geral constituída por todos os irmãos.
Por sua vez, o Compromisso de 1934 declara estar em harmonia com legislação civil e sem embargo, compromete-se a acatar as leis canónicas, em especial as que se encontram prescritas no Código de Direito Canónico. Nos fins especificados, face ao anterior compromisso, acresce o fim de “promover, subsidiar e intensificar o culto na sua igreja, em especial ao S. Sacramento…”. O documento não empreende quaisquer alterações à sua forma e fins firmados anteriormente.

(1) Nota: O periódico “Olisipo: boletim do Grupo "Amigos de Lisboa", nº83, presume que o milagre ocorrido em Guimarães aliado ao fato de ser mercador, motivou Pêro Esteves a implementar o culto a Nossa Senhora da Oliveira junto da Rua Nova dos Mercadores.

Nota: Segundo consta no "Livro de escrituras e outros documentos da Irmandade da Nossa Senhora da Oliveira" (ACNO/Liv83/23), ao abrir-se os alicerces da obra de reconstrução da ermida, foram encontradas as duas sepulturas de Pêro Esteves o fundador da ermida, e de sua esposa, Clara Geraldes.

Instanta
Igreja e Sacristia da Irmandade dos Clérigos do Porto
B · Pessoa coletiva · 1707-00-00 a -

A Igreja e Sacristia da Irmandade dos Clérigos do Porto constituía o sector orgânico central à vida religiosa da Irmandade. De facto, até à instituição do Coro dos Clérigos em 1762, era a Igreja e Sacristia que congregava a realização de todos os actos de culto da Irmandade.
A principal figura deste sector era o Tesoureiro da Igreja e da Sacristia, que deveria ser um Irmão presbítero, com as seguintes características: dar um bom exemplo, ser de consciência, recolhimento e reconhecido asseio. O Tesoureiro da Igreja era nomeado pela Mesa e estava encarregado de zelar e velar por tudo o que pertencia e dizia respeito ao culto divino. Com a formação do Coro em 1762, esta figura passou a desempenhar funções em ambos os sectores, tal como se declara no Capítulo 9.º, § 1.º, fls. 14 a 15 dos Estatutos do Coro de 1782: «Posto que o Thezoureiro da Sachristia não pertença absolutamente as obrigaçoens do Coro, se não ao todo da Igreja, com tudo tem alguas dependencias que se embaração com elle (…)». Para além da sua actuação no funcionamento do Coro e da Igreja, o Tesoureiro da Sacristia poderia ainda ser aprovado para confessar e acumular vários cargos, nomeadamente o de cartorário da Irmandade (Capítulo 12.º, Artigo n.º 91, fl. 18 do Regulamento do Coro do séc. XX) e, após 1762, o de Capelão do Coro.
Do ponto de vista da produção documental, o Tesoureiro da Igreja e da Sacristia era responsável pelo livro dos assentos das pessoas sepultadas na Igreja; no final de cada ano deveria realizar um rol descritivo dos bens que lhe foram entregues no início do desempenho das funções e daqueles que restavam; e estava ainda encarregado de receber da mão do Secretário o pagamento do serviço religioso, que deveria fazer distribuir pelos capelães. No que diz respeito às funções relacionadas com o culto divino, destacam-se as seguintes tarefas: fazer a exposição do Santíssimo Sacramento; ver as licenças dos sacerdotes que quisessem exercer ordens na Igreja da Irmandade; mandar abrir as portas da Igreja e tocar os sinos; acender as velas necessárias para os diversos actos do culto; preparar na Sacristia tudo o que fosse necessário para os diversos actos de culto e fazer conservar em boa ordem, arrumados e limpos, todos os paramentos e alfaias da Irmandade. O Tesoureiro da Igreja deveria ser uma presença constante na mesma e não poderia ausentar-se sem licença e só quando devidamente substituído por um sacerdote responsável, que ficasse encarregado das suas atribuições. Esta obrigação de permanência no local tornava-o numa figura importante da vida da Irmandade, pelo que estava encarregado de manter todos os empregados inferiores no cumprimento exacto de todas as suas obrigações. Podia ainda, com a concordância da Mesa, nomear e despedir os Meninos do Coro, que ficavam sob a sua dependência e, por tal, deveriam igualmente prestar assistência aos actos do culto da Sacristia.
De forma a cumprir as suas funções, o Tesoureiro da Igreja e da Sacristia dispunha de um ajudante - que deveria estar sujeito a um regulamento especial -, nomeado pela Mesa sob proposta do Tesoureiro. Contava igualmente com o apoio de pessoal menor e trabalhadores remunerados, tal como o sineiro; o porteiro; os coveiros que abriam sepulturas; os armadores; assim como a da lavadeira e brunideira, no que dizia respeito à manutenção da limpeza e asseio dos bens da Sacristia. Deste pessoal auxiliar destaca-se a figura do porteiro, que embora devesse obedecer em primeiro lugar à Mesa e ao Secretário, cumpria igualmente ordens do Tesoureiro da Igreja e da Sacristia. Neste sector tinha tarefas de apoio à limpeza, de colocar água nas pias e de manter afastadas pessoas estranhas à vida quotidiana da Irmandade, sobretudo da parte da noite.
Esta secção engloba documentação que se relaciona com o funcionamento da Igreja e Sacristia da Irmandade dos Clérigos do Porto, tanto do ponto de vista dos ritos religiosos aí celebrados, como da administração financeira da Igreja. Entre esta documentação destacam-se os livros de registo das missas celebradas por alma dos Irmãos; as certidões de missas; assentos de termos de sepultura de fiéis e Irmãos; assim como a documentação de registo das despesas com a Igreja e Sacristia da Irmandade. Esta secção é constituída igualmente por documentação relativa aos diversos altares e devoções religiosas praticadas na Igreja da Irmandade dos Clérigos do Porto, como é o caso da Senhora da Lapa, Senhora das Dores, Santo André e aos padroeiros da Irmandade.

Hospital da Irmandade dos Clérigos do Porto
C · Pessoa coletiva · 1754-00-00 a c. 1843-00-00

O Hospital da Irmandade dos Clérigos do Porto, em concordância com a missão base da Irmandade, foi criado com o objectivo de socorrer os clérigos pobres e doentes da cidade, incluindo os que não eram Irmãos. Oficialmente designado como Hospital da Irmandade, é comum ser referido na documentação da época apenas como Enfermaria, provavelmente em referência à casa da enfermaria, na qual se encontravam os leitos onde eram instalados os enfermos. Para além desta divisória principal, o Hospital incluía igualmente um altar, uma casa da sacristia, cozinha e um quarto para o Enfermeiro-Mor.
O Hospital estava sob imediata superintendência do Presidente ou, por delegação deste, do Secretário da Irmandade. A gerência e fiscalização desta secção de assistência física e espiritual, por sua vez, estavam incumbida a um deputado da Mesa, que tinha a obrigação de visitar a mesma diariamente durante os meses em que exercia a função de mordomo do Hospital. A nível interno, o Hospital era dirigido pelo Enfermeiro-Mor e contava igualmente com enfermeiros menores, cirurgiões e médicos, assim como um conjunto de criados e ajudantes, dos quais se destaca o Moço da Enfermaria.
O tratamento fornecido no Hospital da Irmandade incluía duas vertentes: a admissão no Hospital e a assistência aos clérigos doentes nas suas próprias casas. A assistência domiciliária era preferível no caso de doenças contagiosas e o socorro por conta da Irmandade, para além dos cuidados igualmente prestados aos doentes admitidos na enfermaria - com apoio do médico, cirurgião e boticário -, incluía ainda uma esmola. Tanto no caso de admissão como de apoio domiciliário, os clérigos contavam ainda com assistência espiritual - nomeadamente no momento da morte - e com o direito ao enterro, em caso de falecimento.
O período de maior vigor em termos de funcionamento do Hospital da Irmandade, segundo a documentação produzida pelo mesmo, parece ter-se situado entre meados do século XVIII e a década de 20 do século XIX. Em sessão da Mesa de 12 de Fevereiro de 1841 foi deliberado que se tornasse a estabelecer o Hospital para curativo dos Irmãos pobres e doentes e, de facto, nos Estatutos da Irmandade de 1871 ainda há referência à existência do mesmo, apesar de não se conhecer documentação deste período. A partir do século XX, a menção ao Hospital parece desaparecer da documentação e dos documentos regulamentares da Irmandade.
Esta secção engloba toda a documentação que se relaciona com a gestão administrativa e financeira do Hospital e com os irmãos doentes que se recolheram no mesmo, nomeadamente: registo de entradas e óbitos; receitas prescritas pelos médicos; recibos dos enfermeiros, dos médicos e dos cirurgiões; despesa da enfermaria e uma série documental relativa ao fundo do Hospital. Engloba ainda um inventário, que contempla a descrição do altar da enfermaria, sacristia, casa da enfermaria, roupa de cama, serviço de mesa e cozinha, assim como alfaias diversas.

Guilhermina Monteiro
GM · Pessoa singular · 1938-

Terminou o curso de Assistente Social no ISSS-L em 1938.

Guilherme Braga da Cruz
GBC · Pessoa singular · 1916-06-11 - 1977-03-11

Guilherme Braga da Cruz nasceu em Braga a 11 de junho de 1916. Filho de José Maria Braga da Cruz e Maria Isabel Bressane Leite Perry de Sousa Gomes. Cedo recebeu pela tradição familiar os traços que o caracterizariam toda a vida. Seu pai, católico, formado em direito pela Universidade de Coimbra foi advogado, notário, juiz-conselheiro do Tribunal de Contas e deputado. Sua mãe, católica, era filha de Francisco José de Sousa Gomes, lente de química na Universidade de Coimbra e figura preponderante do movimento social católico em Portugal nos finais do século XIX e inícios do século XX.
O ensino primário fê-lo no Colégio Dublin e entre 1926 e 1932 frequentou o Liceu Sá de Miranda, onde arrecadou “esplêndidas classificações”, a par da formação que recebeu dos jesuítas do Centro Académico. Nesse ano de 1932 Guilherme Braga da Cruz matriculou-se em direito na Universidade de Coimbra. Aí foi aluno de grandes mestres do direito, como Paulo Merêa, Luís Cabral de Moncada, Domingos Fezas Vital, Adriano Vaz Serra, Mário de Figueiredo, Manuel de Andrade e Fernando Andrade Pires de Lima. Os documentos contidos no seu arquivo testemunham a sua grande capacidade de absorção, sistematização e composição textual, qualidades que levaram a que Guilherme Braga da Cruz fosse considerado um generoso “sebenteiro” do curso e aluno brilhante, a quem acorriam colegas mais negligentes.
Testemunho destas competências são as “Lições de Direito Civil (Relações de Família) de acôrdo com as prelecções do Ex.mo Senhor Doutor Pires de Lima ao 4.º ano jurídico de 1936”, que coligiu e publicou, na sequência dos sólidos apontamentos que retirou das aulas de Fernando Andrade Pires de Lima. Esta obra conheceu novas tiragens em 1942-1943 e 1949-1953.
Enquanto aluno foi também membro da Secção Centro da Federação dos Estudantes Monárquicos Portugueses e do Centro Académico de Democracia Cristã (CADC), ao qual o seu avô materno, Francisco José de Sousa Gomes, havia dado um impulso preponderante. Aqui sorve a doutrina social da Igreja, contida nas encíclicas de Leão XIII e Pio XI, e contacta, entre outros, com o padre Manuel Trindade Salgueiro, futuro bispo auxiliar de Lisboa e arcebispo de Évora, assistente eclesiástico do CADC e vulto do clero da época. Foi ainda vice-presidente do CADC no ano letivo de 1936-1937, colaborador da Obra dos Pobres, da Obra dos Presos, das Conferências de São Vicente de Paulo, membro da Congregação Mariana e da Liga Eucarística.
No 5º ano jurídico, Guilherme Braga da Cruz escolhe definitivamente a área científica em que se especializará e à qual dedicará o seu labor científico: a história do direito. Aluno de Paulo Merêa em aulas sobre a génese do testamento português, elege a perfiliatio, instituto jurídico da família medieval, como tema central da sua tese de licenciatura “Algumas considerações sobre o instituto da ‘perfiliatio’”, que defende em junho de 1937 e que lhe permite arrecadar 17 valores.
Após algumas interrogações acerca do seu futuro profissional, como se depreende da sua correspondência, Guilherme Braga da Cruz decide dar à sua vasta cultura humanística e sólida formação jurídica o rumo necessário para ocupar a cátedra na Universidade de Coimbra. Assim, como bolseiro do Instituto para a Alta Cultura, estudou em Paris (1938-1939) e em Madrid (1939-1940), fazendo a sua especialização em história do direito. O resultado foi a sua consagração com a apresentação da tese de doutoramento em Ciências Histórico-Jurídicas intitulada "O direito da troncalidade e o regime jurídico do património familiar". As provas de doutoramento decorreram entre 17 e 22 de novembro de 1941, tendo sido aprovado com a classificação de "Muito Bom" e 18 valores.
Entretanto, a 13 de abril de 1939, em licença de deslocação a Portugal, Guilherme Braga da Cruz contrai matrimónio com Ofélia de Azevedo Garcia, natural de Mata de Lobos e irmã dos seus amigos Luís Garcia e António Garcia, posteriormente ordenado sacerdote, com quem Guilherme Braga da Cruz se correspondeu ao longo da vida. Guilherme Braga da Cruz e Ofélia Garcia Braga da Cruz tiveram 9 filhos.
A 8 de janeiro de 1942 Guilherme Braga da Cruz é contratado para provimento do lugar de professor na categoria de primeiro assistente, além do quadro, do primeiro grupo da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Este foi o início da sua carreira profissional. Em 29 de dezembro de 1947 é nomeado professor extraordinário, após realização da prova escrita de comentário a uma parte de Digesto, lição oral sobre “A posse de ano e dia no direito hispânico medieval” e apresentação da tese de concurso "O direito de troncalidade. A exclusão sucessória dos ascendentes”, que constituiu a já prometida segunda parte da tese de doutoramento acerca do direito troncal. No ano seguinte, a 26 de julho, proferiu na Sala dos Capelos a lição sobre “O direito de superfície no direito romano”, levando à sua contratação como professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, do Grupo das Ciências Histórico-Jurídicas, a 2 de agosto de 1948.
O discípulo sucedeu ao mestre. Guilherme Braga da Cruz sucedeu a Paulo Merêa na regência da cátedra de História do Direito Português, tendo acumulado a docência desta cadeira com a de História do Direito Romano.
Exerceu o cargo de professor secretário (1951-1955) e de professor bibliotecário (1957-1958) da Faculdade de Direito, sendo responsável pela manutenção e renovação do acervo do Instituto Jurídico. Tomou assento como membro do Conselho Escolar da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, com direito a voto, por deferência do Conselho desde a entrada ao serviço da Faculdade de Direito em 1942.
A 28 de outubro de 1958 Guilherme Braga da Cruz sucedeu a Luís Cabral de Moncada na direção da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e por inerência do cargo foi presidente da Fundação Rangel de Sampaio. Estas funções cessaram a 13 de junho de 1961 com a sua nomeação e tomada de posse no cargo de reitor da Universidade de Coimbra.
Como reitor da Universidade de Coimbra, Guilherme Braga da Cruz chega ao lugar mais elevado e honroso do cursus honorum universitatis, como o próprio reconhece: “Ao tomar posse do cargo de reitor da Universidade de Coimbra, ascendo ao lugar mais honroso que um professor desta Casa pode aspirar; mas quero afirmar publicamente que ascendo a um lugar que nunca ambicionei e que de bom grado recusaria se não tivesse considerado a sua aceitação como um imperioso dever de ordem moral.”
Por inerência das funções de reitor, e por Portaria de 28 de junho de 1961, foi nomeado presidente da Comissão Administrativa do Plano de Obras da Cidade Universitária de Coimbra. Na sequência da chamada "crise académica" de 1962, empolada pela comemoração do “Dia do Estudante” e em divergência com a solução encontrada pelo Governo para apaziguar a contestação juvenil, Guilherme Braga da Cruz pediu a exoneração de funções do cargo de reitor, concedida a 6 de dezembro de 1962.
Ainda que curto, o reitorado de Guilherme Braga da Cruz foi pautado por diversos acontecimentos, dos quais importa destacar a sua presença em Angola e Moçambique a propósito do Curso de férias da Universidade de Coimbra no Ultramar, a atribuição dos doutoramentos "honoris-causa" a José de Azeredo Perdigão e a Gilberto Freyre e a preparação do V Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros. No mesmo dia em que viu satisfeito o seu pedido de exoneração do cargo de reitor, Guilherme Braga da Cruz conseguiu ainda do ministro da Educação Nacional a aprovação do quadro de pessoal da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, que havia sido, aliás, uma das condições que tinha colocado para a aceitação do cargo.
No serviço à Universidade de Coimbra, Guilherme Braga da Cruz integrou também o Senado Universitário de Coimbra, pela primeira vez em 1958, enquanto diretor da Faculdade de Direito, e depois, entre junho de 1961 e dezembro de 1962 na qualidade de reitor da Universidade de Coimbra. Posteriormente voltou a ser membro do Senado Universitário como representante-eleito dos professores da Faculdade de Direito, entre 1965 e 1972.
Mais tarde viria a exercer o cargo de diretor da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, de 23 de janeiro de 1971 até à data da sua morte, com a interrupção inerente à suspensão de todas as suas funções públicas na sequência do processo de "saneamento" de que foi alvo, entre agosto de 1975 e outubro de 1976.
Além das funções exercidas nos diversos órgãos da Universidade de Coimbra, Guilherme Braga da Cruz assumiu a presidência de júris de provas de admissão à universidade, realizados em Macau (1965) e em Angola e Moçambique (1967), e integrou júris de doutoramentos e concursos.
A propósito da dedicação de Guilherme Braga da Cruz ao serviço da universidade e do seu interesse pelos problemas académicos, é de assinalar a existência no seu arquivo de documentos produzidos pelos diversos organismos académicos portugueses, e que Guilherme Braga da Cruz recolhia e guardava meticulosamente.
No pós-25 de abril de 1974, Guilherme Braga da Cruz foi fisicamente impedido de dar aulas por deliberação plenária da "União dos Estudantes Comunistas", organismo ligado ao Partido Comunista Português que havia controlado a Associação Académica de Coimbra. Posteriormente, foi suspenso das funções de professor, suspensão comunicada por ofício datado de 20 de agosto de 1975, que em várias alíneas formulava duas grandes acusações: "comprometimento político com o regime deposto" e "actuação altamente repressiva e anti-democrática enquanto Membro do Conselho Escolar da Faculdade de Direito, Reitor da Universidade de Coimbra e Membro do Senado Universitário". O processo de “saneamento” viria a ser arquivado a 9 de outubro de 1976, por despacho do subsecretário de Estado do Ensino Superior.
A par das atividades desenvolvidas no coração da universidade, Guilherme Braga da Cruz teve uma simultaneidade de ligações na academia, espelhada na documentação que produziu no contexto da sua filiação a instituições académicas e científicas. Elencam-se as seguintes: sócio efetivo do Instituto de Coimbra desde 1948 e vice-presidente da direção nos mandatos de 1961-1964, 1966-1967 e 1968-1974; sócio fundador da Sociedade Internacional Francisco Suárez, instituída em 1948, e seu presidente no período de tempo em que exerceu as funções de reitor da Universidade de Coimbra; em 1949, foi nomeado membro da Comissão Portuguesa do Comité International des Sciences Historiques, onde exerceu as funções de secretário entre 1949-1951 e, a partir de 1965, foi presidente da Subcomissão de História do Direito Português; académico correspondente da Academia Portuguesa da História desde 1951 e académico de número (15) a partir de 1960, tendo proferido os “Elogios do Padre Francisco Rodrigues e do Padre Carlos da Silva Tarouca”; membro da Societé Jean Bodin, dedicada ao estudo do direito comparado, na qualidade de membro a partir de 1960; exerceu as funções de membro da Comissão Redatora da "Revista de Legislação e de Jurisprudência" em 1960, da qual redigiu a obra de proporções monumentais "Revista de Legislação e de Jurisprudência (Esboço da sua história)"; membro do corpo diretivo da Verbo-Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura desde o início da década de 1960; colaborador do Max-Planck-Institut für europäische Rechtsgeschichte, desde início da década de 1960; integrou a Academia das Ciências de Lisboa, na sua Classe de Letras, na qualidade de sócio correspondente a partir de 1962; incorporou o Centro Português de Estudos Europeus, na Secção Portuguesa do Centro Europeu de Documentação e Informação em 1963; membro da Académie Internationale des Sciences Politiques desde 1963; no mesmo ano, foi admitido como membro, tendo assumido a representação portuguesa do Seminário de História do Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, na Association Internationale d' Histoire du Droit des Institutions; membro da Académie de Legislation desde 1964; sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo desde 1965; académico correspondente da Academia Internacional de Cultura Portuguesa desde 1967; membro da Sociedade Europeia de Cultura desde 1967; convidado para fazer parte da Alliance Française como seu vice-presidente honorário a partir de 1967.
Além da filiação a instituições académicas, Guilherme Braga da Cruz foi membro de diversas comissões organizadoras ou executivas de encontros científicos, dando provas das suas excecionais capacidades de organização. Destaca-se o Congresso Comemorativo do IV Centenário do Nascimento de Francisco Suárez (1948), homenagem a José Alberto dos Reis (1955), III Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros (1957), IV Centenário da Universidade de Évora (1959), homenagem póstuma a Fernando Andrade Pires de Lima (1971) e VII Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros (1972).
Participante em encontros científicos repartidos entre Portugal, Espanha, França e Brasil, nos quais teve uma participação mais ativa ou mais passiva e, enquanto investigador da história do direito, Guilherme Braga da Cruz apresentou e publicou diversos estudos, dos quais se elencam apenas alguns: "O problema da sucessão dos ascendentes no antigo direito grego", "Direito romano vulgar ocidental", "O jurisconsulto romano", "Formação histórica do moderno direito privado português e brasileiro", "A sucessão legítima no Código Euriciano", "Os pactos sucessórios no antigo direito português", "O Código de Napoleão na formação do moderno direito civil português", "O movimento abolicionista e a abolição da pena de morte em Portugal (Resenha histórica)", "O direito subsidiário na história do direito português" e "Relação do latim com o Direito".
O labor científico de Guilherme Braga da Cruz foi coroado na academia pela atribuição de doutoramentos “honoris-causa” pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, em 1964, e pela Faculdade de Direito da Universidade de Navarra, em 1967.
Dada a sólida preparação jurídica de Guilherme Braga da Cruz, especialmente no que diz respeito à preparação em história do direito e em assuntos relacionados com a evolução do instituto familiar, a sua colaboração foi requerida em dois momentos preponderantes da história de Portugal no século XX. Foi membro da Comissão Redatora do Novo Código Civil entre 1954 e 1966, sendo responsável por elaborar diversos estudos preparatórios do Livro IV, respeitante ao direito da Família. No seguimento desta colaboração, ficou também responsável da presidência da Comissão de Divulgação do Novo Código Civil. Em virtude da dedicação à obra do Novo Código Civil português, Guilherme Braga da Cruz foi agraciado com a Ordem Militar de Cristo, pelo chefe de Estado em 1967.
Entre 1958-1959 foi advogado de Portugal no litígio entre Portugal e a União Indiana, acerca do território de Damão e dos enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli, tendo sido encarregado de analisar as fontes luso-indianas do Período Marata (1939-1818) e de redigir o parecer “Direito de passagem sobre território indiano. (Portugal c. Índia). O período marata (1739-1818). Parecer complementar. (Confronto entre a ‘Preliminary Objection’ e o ‘Contra-Memorial’ do Governo da Índia; e apreciação dos factos agora alegados pela primeira vez)”, além das exposições que preparou para serem lidas no Tribunal Internacional de Justiça da Haia. Este trabalho fê-lo gratuitamente.
Os seus préstimos foram outras vezes requisitados, embora com pouca expressão na totalidade das suas funções. Relatou outros pareceres, relatórios, estudos críticos, regulamentos e projetos legislativos, sendo de ressalvar o parecer que emitiu em 1965 a pedido do bispo da Beira, D. Sebastião Soares de Resende, a propósito da suspensão do jornal “Diário de Moçambique”, no qual denunciou o abuso de autoridade, que punha em causa os acordos vigentes acerca da liberdade religiosa.
Em termos políticos, Guilherme Braga da Cruz foi um tradicionalista, defensor da transmissão hereditária do poder político. Monárquico por tradição familiar e convicção própria, assumiu funções relevantes em organismos monárquicos. Assinale-se a sua qualidade de membro da Junta Diretiva da Causa Monárquica e presidente da sua Junta Distrital em Coimbra, foi único consultor jurídico das quatro comissões do Conselho de Nobreza, membro do Conselho de Lugar-tenência e, entre 1963-1965, lugar-tenente de D. Duarte Nuno, duque de Bragança, com quem, aliás, manteve uma relação de estreita amizade.
Além destas funções exercidas no campo político-ideológico monárquico, Guilherme Braga da Cruz exerceu, por convite ou nomeação, funções em outros organismos de natureza política, limitando-se a dar a sua “colaboração técnica”. No serviço à juventude, foi diretor do Centro Universitário de Devido ao seu posicionamento e ao seu perfil pessoal, foi convidado para secretário-geral do III Congresso da União Nacional, decorrido em Coimbra, e presidente indigitado da IV Secção do IV Congresso da União Nacional, função que acabou por recusar, por indicação dos corpos dirigentes monárquicos. Foi procurador à Câmara Corporativa na qual relatou pareceres importantes como "Assistência aos Funcionários Civis Tuberculosos", "Plano de Formação Social e Corporativa", "Organizações circum-escolares" e "Alterações ao Código Administrativo". Foi também membro da Comissão Portuguesa do Atlântico e vogal da Junta Nacional de Educação, na qual relatou pareceres onde expôs as suas ideias para a projetada reforma do sistema de ensino, em confronto aberto com as políticas governamentais da época.
Guilherme Braga da Cruz teve também atividades no campo empresarial, desde acionista a presidente de Conselhos Fiscais, presidente de Assembleias Gerais e presidente de Conselhos de Direção. A parca existência de documentos produzidos por Guilherme Braga da Cruz neste contexto permitirão supor que a relação com o tecido empresarial terá tido na sua vida um espaço reduzido.
Homem profundamente católico, Guilherme Braga da Cruz pautou a sua vida pelo exercício da caridade cristã, seja pela ajuda prestada a quem a ele acorria, como se constata a partir da sua correspondência, seja pela filiação a instituições católicas. Já foram enunciadas as ligações de Guilherme Braga da Cruz a organismos católicos nos tempos de estudante em Coimbra, é de referir a sua vinculação na qualidade de irmão a Santas Casas da Misericórdia, confrarias e irmandades, comunhão com o caminho de santidade proposto pelo Opus Dei, tendo sido seu cooperador, cavaleiro da Ordem Equestre do Santo Sepulcro de Jerusalém, membro da Comissão Nacional dos Congressos Eucarísticos, sócio efetivo da Associação dos Jurisconsultos Católicos, membro do Conselho Superior da Universidade Católica Portuguesa, sócio fundador e presidente da Assembleia Geral do Círculo de Estudos Sociais Vector e membro da Comissão Luso-espanhola de Estudo Crítico da História de Fátima.
Além destas atividades, Guilherme Braga da Cruz marcou posição no campo doutrinário, pelos diversos textos que escreveu e defendeu diante de variadas assembleias católicas. Identifique-se os textos modelares como: "Bases sociológicas, morais e jurídicas duma concepção cristã do trabalho" (1949), "Direitos e deveres do Estado na Educação" (1952), "A sociedade familiar, segundo a doutrina da Igreja" (1954), "Direitos da família da Igreja e do Estado na educação" (1955), "Sentido cristão duma homenagem. Discurso proferido na sessão solene comemorativa do 25º aniversário da ascensão de Sua Excelência Reverendíssima o Senhor Dom António Bento Martins Júnior ao sólio primacial bracarense (Braga - 17 de Novembro de 1957)", "O Sameiro, à luz dos dogmas comemorados na sua fundação (Imaculada Conceição e infabilidade pontifícia)" (1964) e "Ordem Cristã - seus aspectos social e jurídico" (1966).
Guilherme Braga da Cruz manteve relações epistolares com a hierarquia eclesiástica, como Josemaria Escrivá de Balaguer, fundador do Opus Dei, Pedro Abellán, procurador-geral da Companhia de Jesus, os núncios apostólicos em Portugal, Maximilien de Furstenberg e Fernando Cento, D. Manuel Gonçalves Cerejeira, D. Ernesto Sena de Oliveira, D. António Ferreira Gomes, D. Eurico Dias Nogueira, entre outros.
E ao cabo de uma vida curta mas intensa, deixou inacabados diversos trabalhos e projetos de investigação que preparava, ao morrer prematuramente a 11 de março de 1977, no Porto, foi sepultado no cemitério de Tadim, paredes meias com o Casal do Assento, casa paterna e outrora refúgio de vigílias para a preparação de trabalhos.